segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Livro do Dinho – Capítulo 2

Para você que ansiosamente aguardou, segue a segunda parte do livro do Dinho:

Agora preciso fazer um pequeno flash back. Aguentem só esse pequeno suplício comigo, é curto, só um parágrafo. Hmmm, talvez um pouco mais. Eu sei que é obvio, mas preciso dizer o seguinte: rock sempre foi muito presente na minha vida. Eu sei vocês estão pensando “jura? É mesmo?” Sim, é mesmo e já aviso: ao longo dessa narrativa, vocês vão ouvir isso zilhões de vezes. Então não pensem “mas esse cara já não disse isso”?

Aos onze anos eu conheci o Dado, Bi, Pedro, Hermano e Herbert. Era a turma da 104. Em Brasília é tudo assim, com números, parece coisa de Admirável Mundo Novo. Na época, 1976, o que tava rolando era Led Zeppelin, que tinha acabado de lançar o Presence. Era incrível o que rock estava virando. Algo cada vez maior, cada vez mais distante dos garotos que compravam os discos. Não que nos importássemos muito, pelo contrário, ficávamos embasbacados pela aura de semideuses que aos poucos eles iam adquirindo.

Energia, autenticidade, sinceridade, simplicidade não eram valores que associávamos ao rock. Os reis da cocada preta no momento eram Yes, Genesis, Emerson, Lake and Palmer e etc. O povo do chamado som progressivo era, na verdade, um galho meio retorcido na árvore genealógica do rock. Os caras tinham saído de conservatórios. Aliás, havia ali uma certa contradição, progressivo e conservador ao mesmo tempo. Enfim, eu percebia que eles eram instrumentistas geniais, mas preferia coisas mais nervosas como AC/DC e Black Sabbath. Eu estava completamente tomado pelas bandas. Nada mais me interessava. Era só aquilo. Até minha mãe sabia de cor as letras de algumas músicas de tanto que ouvia de novo e de novo o mesmo disco. E enquanto eu olhava sempre para o mesmo lugar, para os mesmos discos, para as mesmas bandas, não tomei conhecimento da tempestade que se aproximava ali ao meu lado. Bastava um pouco mais de atenção e eu teria visto que os pioneiros da nova era já estavam pondo as manguinhas de fora.

Esse pequeno intervalo serve para mostrar onde estava minha cabeça e a dos meus amigos mais próximos nos primeiros anos da década de 80. Ainda estávamos muito ligados ao som que em pouco tempo seria um anacronismo insuportável.

Mas essa não é a história da minha vida. Ou melhor, não é só da minha vida. É a história de uma época e de várias vidas que, de algum modo estranho, acabaram se cruzando e se misturando pelas décadas seguintes. Além do que, uma autobiografia a essa altura, seria muito pretensioso, então de volta aos acontecimentos. Lá estávamos eu e meus amigos Dado e Pedro sentados embaixo do bloco sem ter o que fazer. A essa altura eles já tinham sido informados da cena que eu presenciara na lanchonete. Estávamos quebrando a cabeça pra bolar um plano para fazermos contato com a outra tribo de roqueiros do pedaço. Tudo bem que eles fizessem um som meio estranho, o que importava mesmo é que era rock. Por uma causa comum e nobre qualquer sacrifício valia a pena. Sobretudo porque o lado de lá parecia se divertir bem mais do que nós.

Não conhecíamos nenhum deles, não saibamos onde moravam, não sabíamos sequer o nome de suas bandas. Em resumo, não sabíamos de nada. Mas numa cidade como Brasília, um dia fatalmente nos encontraríamos. Enquanto isso a vida continuava. Uma existência chata, longa e repetitiva que se resumia basicamente em matar aula, fumar maconha e ouvir discos. A vida em casa não andava bem para nenhum de nós, por isso passávamos o dia inteiro na rua. A tensão doméstica era causada pelos motivos de sempre: crise na escola e pais na iminência do divórcio. Não que a separação em si fosse um problema, tínhamos crescido no final do século e quase todos os nossos amigos tinham pais separados. Tudo bem. O problema é que os meses ou anos anteriores a um divorcio tendem a ser turbulentos. A separação em si tende a vir com certo alivio.

A escola já era outra história, mais complicada e sem solução a vista. Que diabos iríamos fazer das nossas vidas? Àquela altura não tínhamos a mais remota idéia. Sempre invejei pessoas que desde cedo tinham uma vocação clara. Já pensou como a vida de Mozart, por exemplo, tinha sido fácil? Aos cinco anos já tocava pra reis. Assim é mole. Tá bom, tá bom, eu sei, não foi simples assim. O cara foi massacrado pelo pai e acabou sendo enterrado numa vala comum. Mas ao menos ele sabia o que fazer enquanto estava vivo. Desde pequeno. Nós, no entanto, passamos por horas e horas, dias e dias intermináveis, com a certeza absoluta de que a catástrofe nos esperava logo ali atrás da esquina. Ao menos era isso que nos diziam na escola e em casa. Afinal, era obvio que estávamos longe de sermos gênios e também não parecíamos ter uma aptidão especial para nada. A nossa auto-estima não andava muito em alta, mas curiosamente também não nos achávamos burros. A esperança estava nas biografias, muito populares nas ultimas fileiras da sala de aula, de pessoas que tinham sido um desastre na escola, mas depois se recuperaram. Nada demais. Gente como Einstein, por exemplo. Ora, se ele conseguiu, porque não um de nós? Nunca se sabe, sempre há esperança. Bastava acreditar em milagres.

Dado, Pedro e eu passávamos nosso tempo na 104 andando de skate, jogando bola e, claro, experimentando drogas. Aos poucos íamos provando um pouco de tudo. Além de maconha, descobrimos benzina, cola, e cogumelos. Qualquer coisa que caísse nas nossas mãos e produzisse algum efeito era bem-vinda. Dano cerebral? Yeah! Ilegal e proibido? Melhor ainda. Ficar lesado? Ótimo. De um modo geral podia se dizer que estávamos caminhando para um precipício. Nada de bom sairia daquilo, mas nós, mesmo nos dando conta perfeitamente, jamais admitiríamos. E dito e feito: esses excessos nos cobraram um preço caro mais tarde. Nossos fígados, rins, cérebros e afins…

Havia um gramado do lado da Superquadra, logo em frente ao terreno baldio entre a 105 e a 104, onde ficávamos deitados a noite, jogando conversa fora. As pessoas passavam apressadas por ali porque apesar de mal iluminado era o único acesso ao ponto de ônibus, um pouco abaixo no eixão. Esses nomes e números só fazem sentido pra quem morou em Brasília. Então vocês tem duas opções. Ou vão conhecer a capital de vocês, ou estudem a obra de Oscar Niemeyer e Lucio Costa. Não tem jeito. É isso mesmo, é incompreensível.

À noite, aquele não era um lugar para lazer. Por isso, logo nos chamou a atenção, vindo de longe, as gargalhadas de duas meninas, despreocupadamente passeando de bicicleta. Podíamos ouvi-las antes de vê-las, tamanho era o volume. Quando finalmente seus vultos se aproximaram o suficiente do facho de luz do único poste do pedaço, vimos, para nosso espanto, que elas estavam vestidas para matar. Alfinetes , buttons, cabelos coloridos e tudo mais. Elas eram como os caras que estávamos procurando. Voilà! Sem mais nem menos elas tinham caído do céu. Ali estavam elas, todas vestidas e montadas e nada para fazer além de andar de bicicleta…

Como se fosse a coisa mais normal do mundo, elas pararam e se apresentaram. Eram a Ana e Cris. A Cris eu reconheci assim que me aproximei – era a cantora maluca que eu tinha visto na lanchonete alguns dias antes. Eu logo achei a Ana mais bonita. Era uma beleza fora do comum. Ela era nariguda e muito magra. Parecia saída de um filme do Almodovar. Maravilhosa. Começamos a nos cutucar, “vai cara, diga alguma coisa inteligente. Eu não, vai você”, sussurrávamos um para o outro. Então, depois de um pouco de papo furado e um pouco de desconforto adolescente, a conversa naturalmente começou a enveredar para a música. Elas não esconderam seu desprezo pelo nosso gosto e falaram de grupos que não conhecíamos ou dos quais só tínhamos ouvido falar vagamente. Coisas tipo Slits, Siouxsie and the Banshees e Joy Division. Apesar de humilhante, afinal eram duas garotas nos dando uma aula de rock, ouvíamos de boca aberta.

Todo o episódio não deve ter durado mais do que alguns minutos. Mas quando estavam indo embora, a Ana se virou e nos convidou para um show que ia rolar no fim de semana num lugar com o nome bizarro, Kafofo. O nome das bandas? Aborto Elétrico e Blitz 64. Bingo!
Pois é, a vida é assim, cheia de coisas inesperadas. O contato estava feito.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

" FELIZ ANIVERSÁRIO E ROSAS MORTAS PRA VOCÊ"

               YVES PASSARELL
Hoje aniversário do nosso guitarrista YVES PASSARELL, entao #VamosComemorar \o/   Nós do Fã Clube Capital Inicial Brasília desejamos muitas felicidades, muitos anos de vida, muito Rock'n'Roll.